quinta-feira, 16 de abril de 2015

A recuperação judicial da OGX

Fonte: http://mhmlaw.com.br/site/pt/pages/newsletterDetail/280.html

A recuperação judicial da OGX


Por: Antonio Mazzuco, Luiz Donelli e Vitor Martins

Em um momento em que diversas empresas do setor de infraestrutura buscam a recuperação judicial como alternativa para crises de liquidez, a análise da solução encontrada para os casos das sociedades Óleo e Gás Participações S.A. – em Recuperação Judicial – nova denominação da OGX Petróleo e Gás Participações S/A ("Companhia"), OGX Petróleo e Gás S/A – em Recuperação Judicial ("OGX"), OGX International Gmbh ("OGX Gmbh") e OGX Austria Gmbh ("OGX Austria") é oportuna. 

Em 30/10/2013 a Companhia apresentou pedido de recuperação judicial. Em 16/10/2014, os acionistas da Companhia aprovaram, em Assembleia Geral Extraordinária, capitalização de dívida que praticamente liquidou toda a dívida sujeita à recuperação judicial e também dívida extraconcursal no valor total aproximado de US$ 5,4 bilhões de dólares. Isso nos termos do plano de recuperação judicial da Companhia aprovado em Assembleia Geral de Credores ("AGC") de 03/06/2014 ("PRJ").

A capitalização de créditos concursais e extraconcursais no valor de mais de R$ 13 bilhões foi feita mediante alocação de pouco mais de R$ 862 milhões para capital e o restante para a reserva de capital com a emissão de 86.255.986 novas ações ordinárias, nominativas, e sem valor nominal ao preço de R$ 160,00.

Alguns credores se sentiram lesados pelo plano de recuperação e apresentaram objeções à sua homologação. A controvérsia será detalhada a seguir. 

A Recuperação Judicial:

Em 31/10/2013 a Companhia divulgou Fato Relevante informando que em 30/10/2013 distribuíra pedido de recuperação judicial junto a Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro. 

Em paralelo ao pedido de recuperação judicial, a Companhia negociava um Plan Support Agreement ("PSA"), com a finalidade de obter recursos para manutenção de suas atividades, sendo que o PSA estaria atrelado ao PRJ.

Assim, em 24/12/2013, após tratativas entre: (i) credores titulares da maior parte do crédito relativo aos bonds emitidos pela OGX Austria GmbH (empresa estrangeira trazida ao processo de recuperação judicial), no valor de aproximadamente US$ 3,8 bilhões, e garantido pela Companhia ("Bondholders Aderentes"); (ii) acionistas controladores da Companhia; e (iii) OSX Brasil S.A. e suas subsidiárias (em conjunto, "OSX") foi celebrado o Plan Support Agreement, conforme descrito no Fato Relevante da mesma data. 

Os signatários do Plan Support Agreement participariam, em seguida, dos empréstimos ponte ("Bridge Finance") e demais financiamentos sob a modalidade de dip finance ("Financiamento DIP") que viriam a viabilizar a reestruturação das empresas.

A) Bridge Finance:

Os Bridge Finance são empréstimos para financiar as Companhias e mantê-las em operação no curto prazo. Portanto, os recursos são utilizados para o pagamento de fornecedores, prestadores de serviços e funcionários, sem os quais seria impraticável a manutenção das operações da Companhia. 

Conforme o disposto no plano de recuperação da Companhia, o Bridge Finance compunha-se das seguintes operações:
 
A.1) Primeiro Empréstimo Ponte: empréstimo extraconcursal de curtíssimo prazo contraído pela OGPar, no valor de US$ 15 milhões, nos termos do contrato de empréstimo celebrado em 26/12/2013, que foi integralmente pago em 14/03/2014, com recursos do 2º Empréstimo Ponte. Referido empréstimo fora contratado junto a certo fundo denominado "The Fund".

A.2) Segundo Empréstimo Ponte: empréstimo extraconcursal de curtíssimo prazo contraído pela OGX, em 13/01/2014, no valor de US$ 50 milhões, nos termos do Contrato de Pré-Pagamento à Exportação (Export Prepayment Agreement) celebrado com Credit Suisse Brazil (Bahamas), na qualidade de agente administrativo, que foi integralmente pago em 13/03/2014, com recursos aportados com novos financiamentos. Os recursos líquidos foram utilizados para financiar exportações.

A.3) Contratos de Garantias – Segundo Empréstimo Ponte: Note-se que, não obstante a prioridade concedida pela Lei 11.101/05, àqueles que aportarem financiamentos durante a PRJ, com exceção do Primeiro Empréstimo – Bridge Finance – todos os demais financiamentos foram concedidos com a prestação de garantias. Assim, os financiamentos tiveram como garantia cessão de direitos creditórios, penhor de direitos sobre contrato de concessão, penhor de petróleo e gás natural, alienação fiduciária de equipamentos e penhor de ações. As garantias foram liberadas com o pagamento do empréstimo havido em 13/03/2014 com recursos do Financiamento DIP, conforme a seguir.  

A.4) Empréstimo Adicional: empréstimo extraconcursal de curtíssimo prazo contraído pela OGX, ), em 15/04/2014, no valor de US$ 73 milhões, nos termos do Contrato de Pré-Pagamento à Exportação (Export Prepayment Agreement). Os recursos líquidos foram também utilizados para financiar exportações.

B) Financiamento DIP:

Em 27/01/2014, o juiz da 4ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, autorizou a oneração dos bens do ativo permanente da Companhia. Assim, em 07/02/2014, a Companhia, a OGPar, Wilmington TrustNational Association e certos credores e/ou terceiros ("Backstop Novos Financiadores") celebraram o Subscription Agreement Senior Secured Superpriority Post-Petition Debentures ("Contrato de Subscrição"), por meio do qual a Companhia e a OGPar se comprometeram a realizar a terceira emissão de debêntures da OGX, em três séries, cujos recursos -- pouco mais de R$ 730 milhões -- foram utilizados para a quitação integral do Bridge Finance e para financiar determinadas despesas relacionadas à recuperação judicial e à reestruturação da Companhia. 

C) Capitalização dos Créditos Concursais e Extraconcursais:

A última operação prevista no PRJ foi a referida conversão dos créditos concursais e extraconcursais da Companhia. Nesta operação, o passivo (dívida – créditos concursais e extraconcursais) da Companhia foi deslocado para o lado do ativo (patrimônio líquido), ou seja, capitalizou-se a empresa com os créditos concursais e extraconcursais.

A referida operação, que ocorreu em 16/10/2014, foi concretizada nos seguintes termos: a Companhia aumentaria seu capital social no valor de pouco mais de R$ 862 milhões, de tal forma que mais de R$ 13 bilhões seriam atribuídos à reserva de capital, sendo emitidas 86.255.986 novas ações, ordinárias, nominativas, escriturais e sem valor nominal ao preço de R$ 160,00. 

Descrição das Operações:

O PRJ previa a operação financeira denominada de Bridge Finance. O Bridge Finance foi realizado e concretizado antes da deliberação da AGC, que foi tomada somente em 03/06/2014. Tal fato foi justificado pela necessidade urgente de caixa pela Companhia.

Assim, os Bridge Finance foram celebrados em 26/12/2013, 13/01/2014 e o empréstimo adicional em 15/04/2014, nos valores aproximados de US$ 15 milhões, US$ 50 milhões e US$ 73 milhões respectivamente, conforme se constata da análise das atas de assembleias, fatos relevante e demonstrações financeiras da Companhia. 
 
O PRJ previa, também, o Financiamento DIP. O Financiamento DIP injetaria na Companhia o valor de até R$ 730 milhões com a emissão de debêntures - créditos extraconcursais com garantias fiduciárias e reais, que conferem a seus subscritores uma condição super prioritária de pagamento em relação aos demais créditos – sendo que os valores decorrentes desta operação seriam destinados ao pagamento dos Bridge Finance, bem como à manutenção do caixa da Companhia à médio prazo.

Já foram subscritas e integralizadas a primeira, segunda e terceira tranches do Financiamento DIP, ou seja, a Companhia já se capitalizou por meio das três tranches previstas no PRJ, nos valores aproximados de R$ 299 milhões e de R$ 215 milhões, respectivamente. 

A última fase da operação prevista no PRJ da Companhia foi a operação de capitalização dos créditos concursais.

Assim, temos o panorama geral das operações referentes ao PRJ realizado pela Companhia, ou seja, desde o pedido de recuperação judicial distribuído em 30/10/2013 até a presente data. 

Apresentadas as operações realizadas de acordo com o PRJ, para reestruturar a Companhia, a seguir alguns pontos considerados controversos pelos credores minoritários.

Tratamento Desigual:

Conforme se pode verificar dos autos do processo de recuperação judicial, houve diversas reclamações sobre a aprovação do PRJ, haja vista, desde sua a homologação, existirem credores insatisfeitos e contrários às operações realizadas. 

Os credores e o Ministério Público, na condição de custus legis, insatisfeitos com a modificação das condições financeiras do PRJ propostas na AGC, propuseram medidas judiciais – Agravo de Instrumento - contra a decisão de homologação do plano havida em 13/06/2014 - em razão da falta de publicidade em tempo hábil para participarem da subscrição das debêntures, principalmente, como subscritores do Primeiro DIP.

Os referidos agravos tinham como intuito questionar a operação do ponto de vista econômico e legal, haja vista que, aos credores minoritários, não teria sido dada a opção de subscrever as debêntures de primeira e segunda série. As debêntures dessa série passaram a ter vantagens superiores, com relação aos demais créditos, no que se refere à conversão em capital.

A Companhia, por outro lado, alega que as disposições e condições para subscrição estavam e foram disponibilizadas em seu site, sendo que os credores minoritários que agravaram da decisão não subscreveram as debêntures por falta de interesse. Alegou ainda que a Companhia procurava investidores há algum tempo e que não houve, por parte dos credores minoritários, qualquer manifestação nesse sentido.

Para elucidar melhor a questão referente aos privilégios ofertados pela Companhia aos subscritores da 1ª série do Financiamento DIP, segue abaixo tabela com as participações acionárias e valores aportados na Companhia por cada classe de debenturistas e credores concursais, conforme Agravo de Instrumento n.º 0039682-69.2014.8.19.0000 proposto pelo Ministério Público, em cada uma das três operações acima mencionadas:


Credores

Valor

Participação da Nova Empresa

1ª série de Debêntures

US$ 125 milhões

41,9767% = US$ 29.650.500,00

2ª série de Debêntures

US$ 90 milhões

23,0233% = US$ 45.349.500,00

Credores Concursais

US$ 5.4 bilhões

25% = US$ 375.000.000,00


Resultado:

Credores

Fator de Conversão por Cada Dólar Investido

1ª série de Debêntures

US$ 5,0372

2ª série de Debêntures

US$ 3,8372

Credores Concursais

US$ 0,0691


As tabelas acima indicam uma diferença significativa na razão de conversão entre os créditos da primeira série e a segunda série das debêntures e os credores concursais. A justificativa da Companhia para essa diferença reside no fato de que as debêntures são créditos extraconcursais e os Backstop Novos Financiadores – não obstante todas as garantias concedidas -- apostaram na Companhia em um momento delicado, quando o plano de recuperação estava em seu início e, como tal, deveriam ser recompensados com essas vantagens. 

No referido Agravo de Instrumento interposto, o Ministério Público alegou que os credores minoritários, caso estivessem ao par das referidas vantagens que vieram a ser concedidas, estariam dispostos a participar da subscrição de debêntures.  

Outra controvérsia residiu refere-se à cláusula 4.6.2 e Anexo 1.1.96 do PRJ, que limitaram a participação na terceira série das debêntures aos credores que não tivessem nenhuma oposição e houvessem renunciado a qualquer pretensão contra o PRJ.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro acolheu em parte os anseios dos credores minoritários, conforme decisões proferidas em 04/12/2014 nos Agravos de Instrumentos propostos pelos credores minoritários e pelo Ministério Público. Nessas decisões o tribunal manteve a validade e eficácia da primeira e segunda emissão de debêntures e dos critérios de conversão mas permitiu aos credores minoritários subscrever e integralizar a terceira série de debentures do Financiamento DIP.

Conforme Fato Relevante de 18/09/2014, a Companhia voltou a ter suas ações negociadas, concluindo assim mais um passo de seu PRJ.

Em fato relevante publicado em 09/04/2015, a Companhia informou que, em razão do baixo valor do petróleo no mercado internacional, não atingirá as condições precedentes para a conversão das debêntures do Financiamento DIP, o que deveria ter ocorrido até 11.04.2015 e que também não possui os recursos financeiros necessários para o pagamento do Empréstimo Adicional.

No dia 10/04/2015, a Companhia anunciou, por meio de fato relevante, que seus acionistas controladores e determinadas afiliadas celebraram um Contrato de Suporte e Standstill para concessão de período de standstill ("Contrato de Suporte e Standstill"), com certos credores anuentes ("Credores Anuentes"), detentores da maioria das debêntures conversíveis emitidas pela OGX, Financiamento DIP. 

O Contrato de Suporte e Standstill permite à OGX e à Companhia tempo para negociar soluções para o pagamento do Empréstimo Adicional, sem que os Credores Anuentes iniciem demandas judiciais contra a Companhia e a OGX, ou que ocorra o vencimento antecipado das debêntures. Assim, a Companhia e a OGX terão até 15/08/2015, para encontrar alternativas para o pagamento do Empréstimo Adicional ou para satisfazer as condições precedentes para a conversão do Financiamento DIP.

***
Em síntese, o caso em análise, por ser se tratar da maior recuperação judicial em volume já realizada na América Latina, por si só, já demonstra sua relevância. O processo de recuperação judicial da OGX cria um novo paradigma na área de recuperação judicial, tendo em vista os aportes de recursos realizados pelos e a capitalização dos seus créditos, com a diluição dos antigos controladores. 

terça-feira, 7 de abril de 2015

Falido pode propor ação rescisória para desconstituir decreto falimentar

STJ

Falido pode propor ação rescisória para desconstituir decreto falimentar

Para STJ, não se pode tirar do falido o direito de lutar contra a decisão que decreta a falência.

terça-feira, 7 de abril de 2015

A decretação de falência acarreta ao falido a perda de certa autoridade referente aos direitos patrimoniais envolvidos, mas não o torna incapaz, de forma que mantém a legitimidade para a propositura de ações pessoais.

Com base nesse entendimento, a 3ª turma do STJ, por maioria de votos, decidiu que o falido tem capacidade postulatória para propor ação rescisória visando desconstituir o decreto falimentar. "Dizer que o falido não pode propor ação rescisória do decreto falencial é dar uma extensão que a lei não deu", ponderou o ministro João Otávio de Noronha, relator do acórdão.

Único caminho

Noronha explicou que o objetivo da ação não era discutir a respeito de bens, mas pedir a nulidade da decisão que mudou a situação da empresa, fazendo com que deixasse de ser solvente para ser insolvente juridicamente. Segundo o ministro, esse não é um interesse da massa falida nem dos credores, de forma que "o falido ficaria eternamente falido, ainda que injustamente, ainda que contrariamente à ordem legal".

Para Noronha, não se pode tirar do falido o direito de lutar contra a decisão que decreta a falência. "Veja-se que é o único caminho que tem para reverter a decisão que, segundo ele, fere frontalmente a ordem legal", destacou o ministro. "O falido não pode, realmente, vender, não pode comprar, não pode administrar, mas pedir a reversão do seu status falimentar, como uma questão que atinge a sua pessoa, só ele pode fazer."

Seguindo esse entendimento, o colegiado deu provimento ao recurso de uma empresa que teve sua ação rescisória extinta sem julgamento do mérito por ter sido considerada parte ilegítima. A decisão da Turma reconhece a legitimidade da empresa falida e determina a volta do processo à instância de origem para prosseguir o julgamento da rescisória.

Confira o voto vencedor.