terça-feira, 9 de setembro de 2014

RECUPERAÇÃO JUDICIAL. INDEFERIMENTO DA INICIAL POR AUSÊNCIA DE DOCUMENTO ESSENCIAL A PROPOSITURA DA AÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. OBSERVÂNCIA AO PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA.

70058259185
Comarca de Charqueadas
25-03-2014
Jorge Luiz Lopes do Canto

PODER JUDICIÁRIO 
 
---------- RS ----------

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

 
 
 
 
 

JLLC

Nº 70058259185 (N° CNJ: 0018481-16.2014.8.21.7000)

2014/Cível

    APELAÇÃO CÍVEL. FALÊNCIA E CONCORDATA. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. INDEFERIMENTO DA INICIAL POR AUSÊNCIA DE DOCUMENTO essencial a propositura da ação. PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA.

    1. A parte agravante se insurgiu contra a sentença que indeferiu a inicial do pedido de recuperação judicial, sob o argumento de que a requerente não trouxe aos autos os documentos indispensável à propositura da demanda.

    2. O princípio da preservação da empresa, insculpido no art. 47 da Lei 11.101/2005, dispõe que a recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação daquela, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

    3. Ressalte-se que a não apreciação do pedido de recuperação judicial poderá importar no rompimento das relações comerciais entre a empresa recuperanda e seus clientes, os quais se sentiriam prejudicados, impossibilitando que a referida sociedade comercial cumpra a sua função social, causando prejuízo e lesão a toda a cadeia de fornecedores, funcionários, fisco e credores, os quais poderão não ter os seus créditos satisfeitos.

    4. Ademais, as exigências no que diz respeito aos documentos pertencentes à empresa recuperanda, bem como em relação à regularidade de sua atividade comercial devem ser  atividade regular da empresa devem ser avaliadas com ponderação pelo julgador, considerando as peculiaridades de cada sociedade comercial, com vistas à análise do pedido de recuperação judicial, cuja natureza jurídica é de um favor creditício.

    5. Assim, com base nos parâmetros precitados, e levando em conta o objetivo do pedido de recuperação formulado e a sua importância para a sociedade como um todo, a circunstância apontada pelo magistrado a quo, qual seja, a falta de apresentação pela empresa recuperanda da certidão de protesto, por si só, não tem o condão de obstar a apreciação do pedido de recuperação judicial.

    6.  Por outro lado, no que concerne à certidão de protesto, diante das dificuldades financeiras narradas pela requerente, poderá o julgador de primeiro grau solicitar o fornecimento daquela mediante expedição de ofício à respectiva serventia, determinando a inclusão do valor das custas como crédito extraconcursal, a teor do que estabelece o artigo 67 da Lei 11.101/2005.

    Dado parcial provimento ao apelo e desconstituída a sentença. 

Apelação CívelQuinta Câmara Cível
Nº  70058259185 (N° CNJ: 0018481-16.2014.8.21.7000)Comarca de Charqueadas
MANOEL C. DE SOUZA - MEAPELANTE
A JUSTICAAPELADO

ACÓRDÃO

 

           Vistos, relatados e discutidos os autos.

           Acordam os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento ao apelo e desconstituir a sentença.

           Custas na forma da lei.

           Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Luís Augusto Coelho Braga (Presidente) e Des.ª Isabel Dias Almeida.

           Porto Alegre, 25 de março de 2014. 
 

DES. JORGE LUIZ LOPES DO CANTO,

Relator.

    I - RELATÓRIO

                 Des. Jorge Luiz Lopes do Canto (RELATOR)

           MANOEL C. DE SOUZA – ME (SUPERMERCADO DOMINGÃO) interpôs recurso de apelação da sentença que indeferiu a inicial do seu pedido de recuperação judicial e julgou extinto o processo.

           Nas razões recursais às fls.138/148 dos autos a parte apelante aduziu, em suma,  que todos os documentos essenciais exigidos no artigo 51 foram apresentados, à exceção do disposto no inciso IV, que trata da certidão de protestos, pois não dispõe do valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) para o pagamento das custas de sorte a obtê-la, não podendo ser penalizada por esta circunstância.

           Acrescentou que foi diligente e não seria justo extinguir o feito, sendo mais lógico baixar o processo à origem para no mínimo cumprir a diligência da certidão de protesto, sendo que para tanto efetuará um empréstimo pessoal.

           Postulou o provimento do recurso, a fim de que seja reformada a fim de que seja reformada a sentença de primeiro grau, dando prosseguimento ao pedido de recuperação judicial.

           É o relatório.

    II - VOTOS

                Des. Jorge Luiz Lopes do Canto (RELATOR)

            Admissibilidade e objeto do recurso

           Eminentes colegas, o recurso intentado objetiva a reforma da sentença de primeiro grau, versando sobre pedido de recuperação judicial julgado extinto em face do indeferimento da petição inicial.

           Os pressupostos processuais foram atendidos, utilizado o recurso cabível, há interesse e legitimidade para recorrer, este é tempestivo e foi devidamente preparado, estando acompanhado da documentação pertinente e inexistindo fato impeditivo do direito recursal, noticiado nos autos.

           Assim, verificados os pressupostos legais, conheço do recurso intentado para o exame das questões suscitadas.

           Matéria discutia no recurso em análise

           No caso em exame merece guarida a pretensão da parte apelante, devendo ser reformada a sentença de primeiro grau pelas razões a seguir alinhadas.

           Denota-se dos autos que a parte recorrente se insurgiu contra a sentença que indeferiu a inicial do pedido de recuperação judicial, sob o argumento de que a requerente não trouxe aos autos o documento indispensável à propositura da demanda.

           Note-se que o princípio da preservação da empresa, insculpido no art. 47 da Lei 11.101/2005, dispõe que a recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação daquela, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

           Acerca do tema em discussão ensina Fazzio Júnior1, uma vez mais, o que segue:

    O princípio da conservação da empresa parte da constatação de que a empresa representa "um valor objetivo de organização que deve ser preservado, pois toda a crise da empresa, causa um prejuízo à comunidade" (LOBO, 1996:6).

    O objetivo econômico da preservação da empresa deve preponderar, em regra, sobre o objetivo jurídico da satisfação do título executivo, se este for considerado apenas como a realização de pretensão singular. O regime jurídico de insolvência não deve ficar preso ao maniqueísmo privado que se revela no embate entre a pretensão dos credores e o interesse do devedor. A empresa não é mero elemento da propriedade privada.

    Resumindo o caráter insatisfatório das normas concursais ortodoxas, valem as palavras de Fernández-Rio (1982: 150), ao comendar que, na crise econômica de uma empresa, sobre o próprio devedor, sofrem os credores e sofre a sociedade. 

           Ressalte-se que a não apreciação do pedido de recuperação judicial poderá importar no rompimento das relações comerciais entre a empresa recuperanda e seus clientes, os quais se sentiriam prejudicados, impossibilitando que a referida sociedade comercial cumpra a sua função social, causando prejuízo e lesão a toda a cadeia de fornecedores, funcionários, fisco e credores, os quais poderão não ter os seus créditos satisfeitos.

           Ademais, as exigências no que diz respeito aos documentos pertencentes à empresa recuperanda, bem como em relação à regularidade de sua atividade comercial devem ser atividade regular da empresa devem ser avaliadas com ponderação pelo julgador, considerando as peculiaridades de cada sociedade comercial, com vistas à análise do pedido de recuperação judicial, cuja natureza jurídica é de um favor creditício.

           Assim, com base nos parâmetros precitados, e levando em conta o objetivo do pedido de recuperação formulado e a sua importância para a sociedade como um todo, entendo que a circunstância apontada pelo magistrado a quo, qual seja, a falta de apresentação pela empresa recuperanda da certidão de protesto, por si só, não tem o condão de obstar a apreciação do pedido de recuperação judicial.

           A esse respeito é o aresto a seguir transcrito:

    APELAÇÃO CÍVEL. PEDIDO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. ARTIGOS 47 E 51 DA LEI 11.101/2005. INDEFERIMENTO DA INICIAL. DECISÃO REFORMADA. PRINCÍPIO DE PRESERVAÇÃO DA EMPRESA. VIABILIZAR MEIOS DE SUPERAÇÃO DA CRISE FINANCEIRA DA EMPRESA REQUERENTE. APELO PROVIDO. A Lei de Recuperação Judicial, especialmente, em seu artigo 47, tem por objetivo viabilizar a superação da crise financeira da empresa, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica. Proveram o apelo. Unânime. (Apelação Cível Nº 70039111679, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Artur Arnildo Ludwig, Julgado em 26/05/2011).

           Por outro lado, no que concerne à certidão de protesto, diante das dificuldades financeiras narradas pela requerente, poderá o julgador de primeiro grau solicitar o fornecimento daquela mediante expedição de ofício à respectiva serventia, determinando a inclusão do valor das custas como crédito extraconcursal, a teor do que estabelece o artigo 67 da Lei 11.101/2005.

           Dessa forma, deve ser dado parcial provimento ao apelo, para desconstituir a sentença de primeiro grau e determinar o prosseguimento do feito com a análise do pedido de recuperação judicial.

    III - DISPOSITIVO

           Ante o exposto, voto no sentido de dar parcial provimento ao apelo, para desconstituir a sentença de primeiro grau e determinar o prosseguimento do feito com a análise do pedido de recuperação judicial. 
 

Des.ª  Isabel Dias Almeida (REVISORA) - De acordo com o(a) Relator(a).

Des. Luís Augusto Coelho Braga (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a). 

DES. LUÍS AUGUSTO COELHO BRAGA - Presidente - Apelação Cível nº 70058259185, Comarca de Charqueadas: "DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO E DESCONSTITUÍRAM A SENTENÇA. UNÂNIME." 
 

Julgador(a) de 1º  Grau: JAIME FREITAS DA SILVA

1 Fazzio Júnior, Waldo. Lei de Falências e Recuperação de Empresas. 4ª ed. São Paulo: Atlas. 2008. p. 21.

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