Fonte: Valor Econômico
Publicado por: Coped
Data do documento: 02/04/2009
Impostos em dia, salários dos empregados e pagamento dos fornecedores também. No início dezembro do ano passado, essa era a situação de uma empresa de médio porte do Estado de São Paulo. No mesmo mês, porém, a companhia, que estava livre de protestos, entrou com um pedido de recuperação na Justiça. Surpreendida com a suspensão da rolagem de uma dívida que há anos era automaticamente renovada por três instituições bancárias, a empresa, antes de ter seus débitos executados, pediu recuperação judicial. O caso, que parece contraditório, ilustra a situação vivida por inúmeras empresas diante da crise. Sai de cena o perfil clássico do endividamento geral e entra o de empreendimentos que não possuíam "dívidas", mas que estavam comprometidas com linhas de crédito bancário utilizadas para a manutenção do fluxo de caixa. A mudança do tipo de endividamento é relatada por escritórios de advocacia especializados em recuperação judicial e reestruturação de empresas, que a partir de novembro de 2008 passaram a receber casos como esse.
No Advocacia De Luizi, por exemplo, dos 90 clientes em recuperação judicial hoje, 15 fazem parte desse novo perfil e procuraram a banca a partir de novembro. "Essas empresas buscaram auxílio jurídico porque não conseguiram a renovação das linhas de crédito, não obtiveram crédito em outros bancos e, de um dia para o outro, foram cobradas do principal da dívida", afirma Fernando Fiorezzi de Luizi, sócio da banca. Ao entrar em recuperação, os débitos passados da empresa ficam suspensos por 180 dias e passam a integrar o plano de recuperação judicial, motivo pelo qual muitos têm recorrido ao instrumento.
Em situação semelhante estão alguns novos clientes do escritório Limongi, Wirthmann Vicente e Bruni Advogados. O sócio da banca, Edemilson Wirthmann Vicente, afirma que dez empresas que atende possuem o mesmo histórico: seus pagamentos em geral estavam em dia, mas elas sofreram com a suspensão das linhas de crédito ou a redução dessas e, junto com isso, uma queda no faturamento. O advogado afirma que o enxugamento do crédito acaba refletindo nos demais credores, uma vez que esses valores eram utilizados para manter o caixa em dia. No caso desses clientes, um já pediu a recuperação judicial e os outros dois estão elaborando as propostas a serem apresentadas na assembleia de credores. Nos planos, a ideia é aliar a venda de ativos não operacionais, como terrenos e imóveis, ao parcelamento dos débitos em dez anos e uma carência de dois anos para o início do pagamento. Outros cinco clientes ainda estão levantando os documentos necessários para uma recuperação judicial e dois ainda tentam uma negociação com os bancos.
No caso dos clientes do advogado Nelson Marcondes Machado, sócio do escritório que leva seu nome, a opção de seus clientes têm sido a tentativa de composição com os bancos ou uma recuperação extrajudicial - quando todos os credores concordam e não há a necessidade de levar o plano para homologação judicial. Nesse caso, o que se evita é o custo de uma recuperação judicial e a preocupação com a imagem da empresa. Machado afirma que nas oito empresas que atende desde janeiro deste ano, o endividamento é basicamente bancário. Em um desses casos, a empresa possui um passivo com dez instituições, sendo que 65% dele está concentrado em apenas duas. O advogado Júlio Mandel, da banca Mandel Advocacia, afirma que como consultor tem auxiliado muitas empresas na renegociação de passivos com bancos, sem entrar com pedidos de recuperação judicial. Segundo ele, o plano de recuperação fica pronto, mas antes tenta-se a negociação desse débito. "Para muitos clientes o problema é só a falta de liquidez. Entrou em recuperação por falta de crédito, somado ao desequilíbrio do mercado", afirma.
As empresas que já possuíam planos aprovados antes da crise também estão sendo atingidas pela mudança de cenário econômico. O advogado Fernando Fiorezzi de Luizi afirma que muitas empresas estão propondo a revisão de seus planos, pois as perspectivas a longo prazo, como a média de faturamento, mudaram. Ele cita o caso da empresa Tapon Corona Metal Plástico, que realizou alterações em seu plano submetido à assembleia em fevereiro deste ano. O prazo para pagamento do débito foi reduzido de 15 anos para oito anos, mas a empresa conseguiu um deságio de 60% sobre o valor da dívida de R$ 82 milhões.
(Zínia Baeta, de São Paulo)
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