sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

O poder dos credores na recuperação judicial

O poder dos credores na recuperação judicial
Fonte: Valor Econômico
Publicado por: Coped
Data do documento: 13/02/2009


Os credores, na extinta concordata preventiva, eram compelidos a assistir inermes à tramitação longa e monótona do processo e a contabilizar seus créditos na "conta de créditos de duvidosa liquidação", ou, o que era corriqueiro, a vendê-los, por quantias irrisórias, a testas de ferro do próprio devedor, porquanto a revogada Lei de Falências e Concordatas não lhes dava instrumentos para obrigar o inadimplente a honrar os compromissos contraídos.

Época houve, de triste memória, rotulada de era da indústria da concordata, em que o devedor se locupletava às custas dos credores, pois pagava suas dívidas sem correção monetária muitos anos após o vencimento, enquanto os credores empobreciam sem nada poder fazer, eis que a concordata preventiva era um favor legal, concedido, por norma jurídica cogente, ao devedor em mora, que a lei supunha probo e de boa-fé, fato raramente comprovado ao final do processo.

A Lei de Falências e Recuperação de Empresas ? LFRE (Lei nº 11.101, de 09.02.2005) ? mudou radicalmente a situação dos credores na recuperação judicial do devedor, eis que é certo, absolutamente indiscutível, que hoje os credores são os protagonistas do novel instituto e a assembléia geral de credores o órgão soberano e supremo do processo de reerguimento da empresa insolvente, como demonstrei no livro Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência, coordenado pelos professores Paulo Salles de Toledo e Carlos Henrique Abrão (editora Saraiva, 2ª edição, páginas 119 a 202).

Agora, o devedor não sai do buraco se não obtiver a concordância expressa ou tácita dos credores, que se reúnem em assembleia geral para examinar, discutir, propor modificações ao plano de recuperação apresentado pelo devedor e, ao final, votar, aprovando-o ou rejeitando-o, após acurada "ponderação dos valores, princípios e fins" do sistema brasileiro de reestruturação da empresa em crise, minuciosa análise dos autos do processo judicial e escorreito estudo da demonstração da viabilidade econômico-financeira do plano, e, em especial, das propostas de reestruturação do poder de controle, financeira, econômica, administrativa e societária.

Por isso, tenho afirmado que a LFRE, ao disciplinar o instituto da recuperação do empresário e da sociedade empresária produtora ou distribuidora de bens ou de serviços e inserir o país no movimento universal de discussão e aplicação do direito da crise econômica da empresa, o faz com espírito inovador.

Ademais, ao estabelecer, como objeto da recuperação judicial, o saneamento "da situação de crise econômica-financeira da empresa", e, como fins, na esteira do sistema escandinavo, garantir "a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores", dá um passo à frente em relação ao direito francês ? de longe, o melhor que se conhece, muito superior ao americano e alemão ? que busca a preservação apenas da empresa e do emprego, preocupando-se, tão só, como o levantamento do passivo, pondo em segundo plano o pagamento aos credores, o que é nefasto, como demonstra a experiência, pois a salvação da empresa em dificuldades financeiras depende, primordialmente, dos credores.

Por derradeiro, observe-se ? e isto é fundamental para o funcionamento eficaz da assembléia geral de credores ? ao adotar o sistema de dupla maioria, quanto aos credores com garantia real, quirografários, com privilégio geral, com privilégio especial e subordinados, e o voto por cabeça, quanto aos credores trabalhistas e por acidentes de trabalho, nas decisões sobre o plano de recuperação, a LFRE visa a estimular o comparecimento dos credores à assembléia geral, a sua efetiva participação no conclave, qualquer que seja o valor dos seus créditos, ainda que diminutos, e o exercício consciente e responsável do poder que hoje possuem, e do qual não podem e nem devem declinar, sob pena de incorrerem em inescusável omissão.


(Jorge Lobo, advogado)

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